BAÚ DA MEMÓRIA II
DONA LOURDES
BAÚ DA MEMÓRIA II
Arrumando meus arquivos encontrei mais uma história: Dona Lourdes!
Se Barra do Serinhaém era o Paraíso, Dona Lourdes era o anjo. Mais que uma Cozinheira inigualável, era uma amiga de horas de prosas sob a brisa do mar e os raios de Sol da Baía de Maraú/Camamú/Serinhaém.
Navegadores, de todos os tipos de naus que singravam aquelas águas, paravam ali para comer inacreditáveis pratos, dos mais frescos frutos do mar. A salada e a maionese de lagosta dela era afamada. Uma das maravilhas que justificava a existência e a passagem na terra.
Certa feita, reuni vinte e dois casais durante duas noites e três dias lá na vila para celebrar meu aniversário. Meus convidados ocuparam todos os quartos das três únicas pousadas do lugar. Dona Lourdes fez para nós dois jantares e um almoço, inesquecíveis. O Restaurante dela era o ponto permanente de encontro. 72 horas de copos, taças, talheres, praia, mar, barco, mergulhos. Todos sobrevivemos, ilesos, felizes, porém marcados para o resto da vida por uma confraternização inesquecível.
Dona Lourdes era também conselheira, confidente e nos dava o privilégio de nos pedir conselhos e confidenciar segredos. Isso nos fazia amigos leais. Por isso os almoços e jantares sempre duravam acima de duas horas e nunca tinham pressa.
Um dia eu cheguei mais cedo e começamos a prosear na cozinha. Fomos para a sala da casa dela, que ficava ao lado do quiosque do restaurante. Após um café com bolo e biscoitos regionais, voltamos para a cozinha onde ela começou a limpar e tratar os peixes, camarões e lagostas. Trabalhei de ajudante. A certa hora o corpo já pedia cerveja. “Vá se servir que você é de casa!”
Já estávamos no quiosque bebendo e conversando quando chegou um pescador com sua canoa cheia de sardinhas e siris, frescos, ainda vivos. Ela foi fazendo e eu comendo. Depois chegaram Bebetinho e Everaldo, amigos inesquecíveis, homens do mar e da pesca. Passamos a tarde toda e o começo da noite comendo, bebendo, conversando e tomando banho de maré.
Fui muitas e muitas vezes àquele pedaço de céu na terra. Cheguei a comprar uma casa lá, mas não deu certo na reta final do negócio. Deus sabe o que faz.
Um dia, Dona Lourdes morreu. Não sei se pelas circunstâncias da vida, Serinhaém também morreu para mim. Não sei a última vez que fui lá, mas, quando puder irei. Sinto falta e saudades dela, mas também adoro aquele lugar.