AS FASCINANTES GAMELEIRAS DA MINHA TERRA

“As fascinantes gameleiras  da minha terra” é um artigo publicado no “Jornal Ei, Táxi” em março de 2020 e no livro “Reflexões de um cidadão do Mundo”, lançado pela Editora Adelante em 2021.

Desde criança, as formas, as raízes, as dimensões e as copas das gameleiras me chamavam a atenção, como também me despertavam a curiosidade os grandes laços de panos brancos, que os terreiros chamam por “ojá”, amarrados em redor dos seus troncos, em certas épocas do ano.

Andar pelo Dique do Tororó, no Campo Grande e outros cantos encantados da cidade, contemplando os troncos das Gameleiras é como visitar museus e galerias de arte ao ar livre e céu aberto. Cada árvore tem seus esculturais desenhos próprios, suas individualidades caracterizadas, suas fortes personalidades vivas e refletidas no espelho da divina criação. Elas são, como nós humanos, tão iguais aos seus semelhantes em tantas coisas, mas, com grandes, sutis e marcantes diferenças.

Ao sair da contemplação para as leituras a respeito dessa maravilha da natureza, foi com surpresa que aprendi que a Gameleira é também conhecida como mata-pau, pois a espécie costuma nascer sob outras árvores, inicialmente apenas se apoiando, sem aproveitar-se dos nutrientes, mas depois, conforme os ramos nascem e crescem em redor da árvore já formada, começa a sufocá-la até ocupar plenamente seu lugar.

Dizem os botânicos que as Gameleiras são árvores do gênero Ficus, cuja madeira macia e maleável permite a sua utilização para a confecção de gamelas e outros utensílios domésticos, e que as maiores espécies no Brasil são chamadas de Figueira ou Ficus enormis.

No Brasil alguns tipos de Gameleira chegam a medir mais de vinte metros de altura, por isso tem tanto destaque nas paisagens onde se fazem presentes. É através das fezes dos morcegos e dos pássaros que se alimentam dos seus frutos, maduros entre agosto e setembro, que elas são semeadas. Graças ao fenômeno chamado fototropismo, os ramos da gameleira crescem para cima, em busca do sol, a verdadeira e divina luz. Simbólico para mim, que valorizo e respeito muito a terra, as suas poderosas e mágicas raízes crescem em direção ao solo em um fenômeno que os estudiosos chamam de geotropismo.

Declaro-me devoto de Nossa Senhora da Natureza, e em todas as suas manifestações vejo a expressão da Divindade. Por isso, respeito o olhar de árvore sagrada que o povo Yorubá costuma cultuar o Irôco (Chlorophora excelsa), ou Figueira, ou Gameleira, em seus rituais e crenças. Dizem que no Brasil não existe o Irôco, uma árvore majestosa, a “amoreira africana” encontrada da Serra Leoa à Tanzânia e que lá chega a atingir quarenta e cinco metros de altura e quase três metros de diâmetro. Como tal planta não existe no Brasil, para o que acreditam, as entidades costumam habitar a Gameleira, segundo bibliografia da Fundação Pierre Verger, que tem um Museu na Barra.

Na parte mais bela, rica, respeitosa e respeitada da miscigenada e multirracial Bahia, berço da hospitalidade e tolerância, o Irôco representa muito a ancestralidade dos que acreditam, os seus antepassados, como também a morada dos Orixás, o seio da natureza. Para eles, desrespeitar as Gameleiras é o mesmo que desrespeitar as suas dinastias e o seu sangue, pois, ela é a história do Ylê (casa) que os protege das tempestades. Suas folhas são utilizadas no preparo de água sagrada nos rituais da cultura afro-brasileira.

Podem chamar de Cerejeira, Doliária, Figueira, Figueira-Branca, Figueira-Brava, Figueira-Grande, Gameleira-de-Cansaço, Gameleira–de-Pinga, Gameleira–de-Purga, Guaporé, Ibapoi, Pau–Bicho-Amarelo ou Gameleira–Branca, mas para mim são esculturas, são fontes de energia e purificação, são obras de artes divinas como são todas as arvores, são as fascinantes Gameleiras da minha terra.

Antônio Carlos Aquino de Oliveira

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